30 setembro 2006

Dia Mundial da Música

Comemoro este último dia de Setembro a ler o poema Schumann por Horowitz de Eugénio de Andrade e a ouvir as Kinderszenen op. 15 e 16 de Robert Schumann pelo pequeno grande pianista Vladimir Horowitz.
Aqui a música é privada e intransmissível mas o poema não. Que fique, pois, nesta pauta sem linhas como forma de universalizar as efemérides que este ano se comemoram. A de W. Amadeus Mozart, Robert Schumann, Shostakovich e Fernando Lopes-Graça.



Schumann por Horowitz


São herança camponesa, as mãos.
Estas pequenas mãos, de geração
em geração, vêm de muito longe:
amassaram a cal, abriram sulcos
frementes na terra negra, semearam
e colheram, ordenharam cabras,
pegaram em forquilhas para limpar
currais: de sol a sol nenhum
trabalho lhes foi alheio.
Agora são assim: frágeis, delicadas,
nascidas para dar corpo a sons
que, noutras épocas, outras mãos
se obstinaram em escrever como
se escrevessem a própria vida.
Ao vê-las, ninguém diria que
a terra corria no seu sangue.
São mãos envelhecidas, mas no teclado
são capazes do inacreditável: juntar
nos mesmos compassos o rumor
dos bosques em setembro e os risos
infantis a caminho do mar.



Eugénio de Andrade
Os Sulcos da Sede
Fundação Eugénio de Andrade
Setembro 2001

21 setembro 2006

Private jokes (take II)

(para Pilantra)
(para Efemerum)
(para Legível)
(para Rach)
(para Sotavento)
(para Anónimos)

19 setembro 2006

Private jokes (take I)

Nota:
Com estes "postais" quase esgotei o espólio fotográfico dos animais nossos amigos e qualquer semelhança entre eles e as vossas excelentíssimas pessoas é pura coincidência:)



(para Nnannarella)
(para Teresa Durães)
(para Bel)
(para Holeart)
(para Pianíssima)
(para Butterfly)
(para Cici)

15 setembro 2006

Revelação



















Rolo as palavras sobre a mesa
num afago de águas côncavas:
a rubra, a amarela intuitiva,
a verde, a transparente,
a negra de ébano profundo,
a turquesa, a branca luz.
Não importa a matiz divinatória
para que os oráculos se cumpram
na língua, uma frase imprevisível lambe
pequenas gotas de orvalho até ao cume.


(Setembro 2006)

13 setembro 2006

Revisitando Dalí


(pelos pés de Maria do Socorro Barbosa, pelos jarros de pintor cearense autodidacta e pela minha fotografia a fazer o pino)

05 setembro 2006

Na pele, todas as peles

O tempo parou quando chegaste.
Nas mãos trazias os três reis magos
esculpidas missangas, a terra prometida
longe do vómito das minas ou das aéreas
marionetas de chumbo. No teu cabelo,
a liberdade era uma crina mansa
e o teu rosto adocicava o azeviche.
Nada sabias de símbolos,
premeditados ardis, embustes. Nos olhos
apenas água emudecida pelo sol.
A tua mesquita esse vazio de sombra,
o teu sabat o pão que não possuías.
Tinhas perdido o fio de todos os começos,
na realidade insana, escravidão de tribos,
e agora que chegaste, inscrevendo na pele todas as peles
com que a humanidade reencontra a sua estrela,
nada mais me separará de ti.


(Setembro, 2006)

01 setembro 2006

Sombras de Agosto